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FCPA E Lei Anticorrupção — Entenda As Diferenças!

FCPA E Lei Anticorrupção — Entenda As Diferenças!

Conteúdo produzido pela LEC em colaboração com Cláudia Massaia, advogada da área de Compliance & Investigações do Demarest Advogados.

FCPA e Lei Anticorrupção são legislações que precisam ser conhecidas por profissionais que desejam se destacar no ramo de Compliance. Neste artigo, você vai encontrar um guia que vai abordar as definições e as principais diferenças entre ambos.

O que é o FCPA e como surgiu?

A sigla FCPA diz respeito à Lei sobre Práticas de Corrupção no Exterior dos Estados Unidos (FCPA – Foreign Corrupt Practices Act), que é considerada a lei pioneira de combate a corrupção no exterior e entrou em vigor em 1977.

FCPA foi promulgado no contexto de uma investigação que gerou uma forte crise política nos EUA, ocasionando a renúncia do então presidente Richard Nixon, em 1974.

Caso Watergate

Para que você entenda melhor, precisamos falar do Caso Watergate, como ficou conhecido o escândalo político em que cinco homens foram presos ao fotografarem documentos e tentarem implantar escutas no escritório do Comitê Democrata Nacional, em Washington. 

Esses homens eram apoiadores do então Presidente Nixondo Partido Republicano.  Ele estava disputando as eleições para o seu segundo mandato e o objetivo era conseguir informações privilegiadas sobre os adversários para utilizar durante a campanha.

Caso você tenha interesse em aprofundar seus conhecimentos sobre o caso, pode assistir também ao filme  “Todos os Homens do Presidente” — essa é uma dica de estudo para você que gosta de materiais complementares cinematográficos.

Por que a bolsa de valores foi relevante para a promulgação do FCPA?

Além do escândalo político do Caso Watergate, as autoridades norte-americanas também estavam investigando doações corporativas realizadas com fins políticos, que revelaram um grande esquema de pagamentos a funcionários públicos estrangeiros.

Nessa investigação, veio à tona o número expressivo de que mais de 400 empresas admitiram ter realizado esses pagamentos indevidos com a finalidade de assegurar seus negócios fora dos Estados Unidos. O valor dos pagamentos somou mais de US$ 300 milhões, quantia alta nesse contexto de crise política e de preocupação com o mercado interno de ações — já que o costume norte-americano de poupar é investir na Bolsa de Valores.

As empresas que negociam seus valores na Bolsa, devem ter seus registros contábeis e os balanços patrimoniais precisos. E, no âmbito dessa investigação, foi verificada a potencial falta de transparência nos registros financeiros das empresas o que poderia disfarçar eventuais resultados negativos e gerar uma crise financeira no mercado interno norte-americano.

Por conta disso, havia uma preocupação com o mercado interno de ações e o FCPA foi promulgado com duas disposições principais: 

  • a disposição antissuborno, que visa combater atos de corrupção no exterior, desde a oferta, promessa ou autorização de pagamento ou qualquer coisa de valor, direta ou indiretamente, a um funcionário público estrangeiro com a finalidade de obter vantagem para si ou para outrem;
  • e a disposição de livros e registros contábeis, que visa o registro preciso de todas as transações financeiras de uma empresa, evitando fraudes nos livros contábeis.

Como surgiu a Lei Anticorrupção brasileira?

A Lei nº 12.846/2013, Lei Anticorrupção brasileira, também foi promulgada em meio à uma crise política, assim como o FCPA.

Com os diversos escândalos de corrupção em 2012 e 2013, houve  manifestações da população contrárias ao governo da época e exigindo ações de combate à corrupção. Em paralelo, também havia uma pressão internacional para a aprovação de uma lei de combate à corrupção que pudesse responsabilizar as empresas por atos lesivos praticados contra funcionários públicos, nacionais e estrangeiros.

Qual a razão da pressão estrangeira?

Faz sentido que a população brasileira estivesse pressionando as autoridades por uma posição, mas qual a razão de existir uma pressão do exterior?

O motivo é que o Brasil é signatário de diversas convenções internacionais, como:

  • a Convenção da Organização das Nações Unidas (ONU) contra a corrupção;
  • a Convenção Interamericana Contra a Corrupção da Organização dos Estados Americanos (OEA);
  • e a Convenção do Combate à Corrupção de Funcionários Públicos e Estrangeiros em Transações Comerciais e Internacionais da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Isso significa que para o nosso país cumprir as disposições dessas convenções, ele precisava aprovar a Lei Anticorrupção Brasileira, a qual já possuía um projeto de lei desde 2010 (PL 6.826/2010).

A Lei Anticorrupção Brasileira foi um marco significativo no combate a corrupção no Brasil. Porém, antes da sua promulgação, já contávamos com outras leis em nosso ordenamento jurídico que permanecem em vigor e visam o combate à corrupção e de atos correlatos. Como o Código Penal Brasileiro, a Lei de Improbidade Administrativa, Lei de Lavagem de Dinheiro, Lei de Licitações, entre outras.

Diferenças entre o FCPA e a Lei Anticorrupção brasileira

Agora que você conhece as duas leis e como surgiram, vamos abordar os pontos que as diferenciam:

1. A quem se aplica

O FCPA se aplica a três grupos distintos, incluindo indivíduos e empresas, enquanto a Lei Anticorrupção Brasileira se aplica somente as empresas. Entenda:

A quem se aplica o FCPA

O primeiro grupo são os ‘emissores’, que são as empresas de capital aberto norte-americanas ou estrangeiras que estão registradas junto à SEC (U.S. Securities and Exchange Commission — Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos).

O segundo grupo é o de ‘preocupações domésticas’, que são as pessoas nascidas ou residentes dos Estados Unidos. Também fazem parte as empresas com sede ou principal local de negócio nos EUA ou organizadas segundo as leis norte americanas.

O terceiro grupo é formado por ‘pessoas naturais ou jurídicas que cometeram qualquer ato em prol da violação do FCPA’. Isso significa que enquanto essa pessoa (física e/ou jurídica) estiver nos EUA ou que de alguma forma seu ato passe por lá, ela estará sujeita às sanções do FCPA.

Um bom exemplo para você entender melhor é o caso da Odebrecht, que apesar de ser uma empresa nacional e não ter capital aberto na Bolsa de Valores norte-americana, foi penalizada no âmbito do FCPA porque, dentre outras ações, conduziu reuniões nos Estados Unidos que resultaram de negócios indevidos incorridos pela empresa.

A quem se aplica a Lei Anticorrupção

Já a Lei Anticorrupção Brasileira responsabiliza objetivamente, nas esferas civil e administrativa, as pessoas jurídicas pelas práticas de atos ilícitos contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira.

Esse é um ponto importante, pois isso a diferencia do FCPA. A lei brasileira só responsabiliza as pessoas jurídicas, ou seja, as empresas e sociedades em geral. O indivíduo que comete o ato de corrupção será penalizado por outras leis, a depender de suas condutas, mas não pela Lei Anticorrupção Brasileira.

2. Autoridades responsáveis

O FCPA pode ser aplicado pelo DoJ (Department Of Justice — Departamento de Justiça dos Estados Unidos) e pela SEC (U.S. Securities and Exchange Commission — Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos).

O DoJ aplica sanções na esfera civil e criminal e SEC na esfera civil, mas as duas autoridades podem investigar e penalizar os indivíduos e as empresas que cometem violações quanto ao FCPA.

Diferentemente dos EUA, que estabeleceu duas autoridades para fiscalizar o FCPA, a Lei Anticorrupção Brasileira é multiagências. Aqui, a autoridade máxima de cada órgão dos poderes: Executivo, Legislativo ou Judiciário é competente para apurar se uma empresa violou a lei. 

Sendo assim, não há uma autoridade específica que pode aplicar a lei, dificultando o interesse das empresas em buscar um acordo.

3. Outros atos responsabilizados

A Lei Anticorrupção Brasileira abarca outros atos, como fraude à licitação e dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos públicos, mas não possui uma disposição sobre os livros e registros contábeis, como o FCPA. 

Entretanto, no seu Decreto Federal n.º 8.420/2015, foi estabelecido como um dos parâmetros de avaliação do programa de integridade registros contábeis que reflitam de forma completa e precisa as transações da pessoa jurídica.  

4. Estabelecimento de padrões de implementação e avaliação de programas de integridade

No cenário norte-americano, o DoJ e a SEC estabelecem através do FCPA – Resourse Guide, o qual foi lançado pela primeira vez em novembro de 2012, informações sobre os requisitos legais do FCPA, exemplos de aplicação da lei norte-americana e resumos das jurisprudências. 

Também, o DoJ publica diretrizes através da “Avaliação de Programas de Compliance Corporativo” (Evaluation of Corporate Compliance Programs) enfatizando as melhores práticas e demonstrando a importância que o DoJ atribui aos programas de compliance efetivos  

Além disso, todas as decisões e acordos celebrados com o DoJ e a SEC são públicos e estão disponíveis através de seus websites. Tais documentos contam com as especificações do que cada empresa precisou estabelecer em seu programa de integridade para cumprir com o acordo firmado.

No Brasil, o Decreto Federal n.º 8.420/2015 estabelece no artigo nº 42, os padrões de avaliação dos programas de integridade que serão levados em consideração pelas autoridades em eventual aplicação da Lei Anticorrupção Brasileira. 

Ainda, algumas autoridades nacionais, como a CGU (ControladoriaGeral da União) e o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) também já emitiram alguns guias orientativos do que as empresas precisam implementar para possuírem um programa de integridade robusto.

5. Os tipos de acordos

De acordo com o FCPA, além das empresas e indivíduos serem condenados, eles também podem celebrar acordos com as autoridades, DoJ e SEC. São eles:

  1. DPA — Deferred Prosecution Agreement — acordo voluntário pelo qual a acusação é postergada mediante a condições a serem cumpridas pelos acusados, como pagamento de multa e/ou implementação de um programa de compliance.
  2. NPA — Non-Prosecution Agreement — acordo voluntário pelo qual a acusação é dispensada pelas autoridades norte-americanas, seguindo determinadas condições, como a correção imediata do ato de violação e aprimoramento do programa de compliance.

Pela Lei Anticorrupção Brasileira é possível celebrar um acordo de leniência, que só diz respeito à pessoa jurídica, uma vez que os indivíduos celebram uma delação premiada. O acordo de leniência possibilita uma redução da multa e a chance de poder continuar contratando poder público, amenizando algumas sanções quando é feito o reporte voluntário e a empresa cooperar com as autoridades. 

6. Responsabilidade subjetiva e objetiva

Além dos dois acordos do FCPA, as autoridades podem desistir de continuar com determinada acusação contra uma empresa e/ou indivíduo. 

Isso pode acontecer porque o FCPA estabelece a responsabilidade subjetiva, ou seja, analisa se houve ou não a intenção da prática daquele ato, bem como se a empresa fez tudo o que estava ao seu alcance para impedi-lo, como aconteceu no caso do Morgan Stanley em que a entidade financeira não foi penalizada no âmbito do FCPA e somente o seu então diretor, Garth Peterson que havia cometido os atos em violação ao FCPA através do banco..

Entretanto, não há essa possibilidade no âmbito da Lei Anticorrupção Brasileira, uma vez que ela estabelece a responsabilidade objetiva, ou seja, a empresa poder ser responsável por atos de corrupção praticados em seu nome ou benefício, ainda que não tenha autorizado ou tenha tido conhecimento da ocorrência do ato lesivo.

Por que um programa de Compliance é importante neste cenário?

O FCPA e a Lei Anticorrupção Brasileira não estabelecem a obrigatoriedade das empresas implementarem um programa de Compliance robusto e efetivo, mas é altamente recomendado que elas o tenham. Com um programa implementado, as chances de uma empresa detectar e remediar um ato indevido são muito maiores, bem como as chances de obter acordos com as autoridades que possibilitam uma redução da pena.

No Brasil, a Lei Anticorrupção Brasileira estabelece até 4% de redução da multa. Considerando que esse valor chegar a R$ 60 milhões — ou que o valor da multa será aplicado sob o faturamento bruto da empresa no ano anterior — o percentual de redução pode ser bastante significativo. Por exemplo, ano passado a Vivo foi responsabilizada no âmbito da Lei Anticorrupção Brasileira e teve que pagar o valor de 0,1% de multa sob o seu faturamento bruto, o que significou uma penalidade em torno de R$ 45 milhões.

Diante desse cenário, é comum que as empresas que atuam no Brasil solicitem um diagnóstico do seu Programa de Integridade para uma consultoria especializada para assegurar que suas diretrizes de conduta estão adequadas as atuais expectativas das autoridades nacionais e internacionais .

Como um bom profissional, você pode se preparar para este cenário de mercado. Aprofunde seus conhecimentos com outros conteúdos como este no blog da LEC.

Imagem: Freepik

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